sábado, 29 de outubro de 2011

Automóveis mais baratos e mais empregos: qual o segredo?

O que precisamos para ter carros mais baratos, manter e ainda gerar mais empregos?

Estamos no centro de um período em que muitos produtos, antes custosos e com baixo desempenho, estão cada vez mais baratos e eficientes/eficazes. Estamos nos referindo aos eletrodomésticos (televisão, geladeira...), eletrônicos (computador, filmadoras..) entre outros , mas ainda não mencionamos os automóveis.
Os automóveis, seguramente, estão melhores e mais eficientes. Entretanto, pouco acessíveis para o consumidor final. É passível de indignação quando nos deparamos com notícias que abordam determinados cenários internacionais como: “países em que as pessoas possuem rendas maiores que as nossas compram um veículo pela metade do preço”. Mas por que este cenário insiste em aparecer?
Certamente, podemos dar um basta nessa história de falar que a culpa é exclusivamente dos impostos. A FIESP Aponta isso como razão maior dos problemas enfrentados pela indústria de transformação. Seguramente, os impostos pesam no composto produtivo, mas em qualquer lugar do mundo eles existem e são altos também. A realidade nua e crua é que as montadoras de automóveis possuem um nível de margem de lucro tal que outros setores não conseguem acompanhar o cenário de lucratividade das montadoras. Não pretendemos entrar no mérito da discussão das razões dessa margem, mas devemos entender que isto se mantém pela falta de concorrência. Elas (poucas montadoras) são os agentes dominantes de um mercado em franco crescimento.
Pois bem, temos boa memória e sabemos que “escancarar” as portas do Brasil e trazer veículos de outras nacionalidades é desastroso para a produção nacional (O trabalhador brasileiro, em tese, sofre os impactos dessas ações). Isto já foi feito há duas décadas (e estão começando a fazer de novo trazendo os carros chineses), e o saldo final foi uma massa desempregada. Para complicar, os concorrentes internacionais se adequam ao sistema nacional, que é atrativo, e com o tempo passam a ser mais um no cartel, não contribuindo tanto no quesito “custos” para o consumidor final. E ainda, as montadoras ditas locais começam a importar componentes (dizendo ser o único meio de manter a competitividade) ou tornam-se também importadoras.
Cada veículo possui em média uma “tonelada” de componentes encaixados que geram muitos empregos e poderiam ser fabricados no Brasil. É isto que precisamos para o desenvolvimento da cadeia produtiva no Brasil; o que gera e mantém empregos para a nossa geração e, sobretudo, para as futuras gerações é criar/fazer os componentes automotivos. Quando saímos na rua e vemos um veículo importado rodando, trata-se de um golpe na geração de empregos. O veículo e um relevante gerador de emprego, além de ser uma boa fonte de arrecadação pública; e o melhor de tudo: precisamos e desejamos marcas, modelos e tudo aquilo que o automóvel é capaz de contemplar.
Vamos agora para a questão central: Veículos mais “baratos” = manutenção e geração de empregos?
Quando importamos, em tese, temos preços mais baixos e como consequência, gera-se desemprego. Este é o cenário com o qual nos deparamos. Entretanto, será que não dá para contemplar os dois fatores da equação acima, ou seja, torná-la de fato uma equação em que um lado corresponde ao outro?
Após muito discutirmos o cenário, chegamos a conclusão que sim, há um meio. A resposta da equação está aqui dentro de nossas fronteiras e diga-se de passagem, território este que é propício para se trabalhar e gerar renda.
A pergunta que poderia responder a equação: Por que não surgem no Brasil montadoras nacionais? Impossível de acontecer?
De modo algum, isto é realmente possível. Temos uma rede de fornecedores de autopeças que dominam e fabricam praticamente todas as peças dos veículos. Temos grandes produtores de ferro, borracha, vidro, plásticos e alumínio que são os principais insumos na fabricação dos componentes. Os componentes os quais temos dificuldade de produzir devido as tecnologias externas são poucos e podem ser importados, pois o automóvel, em função de sua natureza produtiva, tornou-se um produto modular, ou seja, compram-se as partes (pacotes) em qualquer parte do mundo e depois realiza a montagem até se transformar num veículo.
O que estamos esperando para iniciar uma dúzia de montadoras nacionais? Porque os grandes produtores de commodities (ferro, borracha, alumínio e etc) não aumentam o valor agregado de seus produtos entrando nesse segmento?
Agora vem a questão da importação: o que fazer para evitar a concorrência de países que entregam automóveis com design moderno, de baixo custo de aquisição e que apresentam um ciclo de vida curto, ou seja, sua durabilidade é pequena?
Seguramente, temos uma boa alternativa e não refere-se a proibir sistematicamente a importação impondo cotas, por exemplo. Este mecanismo não tem mais espaço no mundo globalizado de hoje, o que realmente precisamos é impor barreiras técnicas eficientes (que é uma forma de protecionismo, porém, uma forma inteligente), da mesma forma que os EUA e os países da Europa fazem.
Se para cada tipo de veículo importado, houver uma lista bem elaborada de exigências quanto o desempenho e segurança do veículo, certamente, o cenário seria diferente. Temos o “Inmetro” que realiza tais procedimentos técnicos para muitos produtos evitando que nosso mercado seja inundado com produtos ineficientes que, por sua vez, eliminam a capacidade de geração de emprego das nossas empresas e ofendem o consumidor consciente.
Segue um exemplo: O consumidor (no mundo inteiro) compra aquilo que alinha-se as expectativas dele e o elemento ‘qualidade e preço’ são condicionantes na decisão de compra. Em alguns segmentos, por exemplo, os mais populares, o preço ainda representa um elemento estimulador de primeira ordem e a qualidade, o consumidor verificará depois do ato já consumado. Na contramão disso, se o produto não tiver requisitos mínimos de qualidade e segurança , certamente, o mesmo poderá ser uma ameaça à segurança e aos direitos mínimos garantidos por lei desse consumidor. Uma prova disso foi um modelo de perua asiática que inundou nosso mercado nos anos 90 e foi muito usada por vendedores de lanches de rua. O Veículo parecia funcional, baixo custo, porém, em determinadas situações de frenagem, o veículo capotava com muita facilidade, além das questões relacionadas a uma mecânica frágil.
Se esses veículos fossem submetidos ao processo de certificação com normas brasileiras exigentes de um mercado desenvolvido e preocupado com a credibilidade do setor, tudo seria bem diferente. O governo deve atuar nesse sentido, porque o consumidor desse segmento, e não é só no Brasil, não consegue ainda na proporção ideal avaliar e definir a qualidade e a segurança do produto que compra. Não é prioridade para uma grande fatia do mercado.
O governo está acenando com incentivos que isentam os tributos do produto final progressivamente, ou seja, quanto mais componentes “made in Brazil” for incorporado ao produto final, maior será a carga de incentivos fiscais. Seguramente, é um cenário promissor para as nossas bases locais de desenvolvimento de produtos, mas não suficiente. Será necessário um plano industrial de incentivos as montadoras nacionais e investir massivamente em barreiras técnicas impedindo uma concorrência externa de qualidade inferior de forma a credibilizar o setor e, sobretudo a P&D, solidificando e gerando empregos sustentáveis, proporcionando preços mais acessíveis e maior qualidade e segurança.




Autores: Engº Cássio Cozman
Prof. Me. Fernando Bueno
Postado em 28/10/2011